• Palmital, 03 de Maio de 2024.

Pagamentos de propina a deputado estadual Ademar Traiano foram feitos dentro da Alep e em prédio onde ele mora

Os pagamentos de propina ao deputado estadual Ademar Traiano (PSD) foram feitos dentro da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) e no hall do prédio onde o deputado mora.
 
As informações foram reveladas pelo empresário Vicente Malucelli em delação premiada firmada com o Ministério Público do Paraná (MP-PR) e homologada pela Justiça.
 
Traiano, que é presidente da Alep, e o ex-deputado estadual Plauto Miró (na época, filiado ao DEM) confessaram ao Ministério Público que pediram e receberam propina de Malucelli, então responsável pela TV Icaraí, que venceu licitação em 2012 para produção de conteúdo para a TV Assembleia.
 
De acordo com o empresário, em setembro de 2015 Traiano recebeu os valores em duas parcelas: a primeira, em espécie, no gabinete da Presidência da Assembleia Legislativa do Paraná. A segunda, em três cheques, no hall de entrada do prédio onde mora.
Confira um trecho da delação:
 
"Os primeiros R$ 50 mil do Traiano eu fui levar em mãos, um envelope, e ele começou, posterior a isso, a me pressionar, assim, ligando... já com tudo isso que tava acontecendo no Brasil, sem nenhum tipo de pudor, me ligar e me pressionar 'cadê meu dinheiro? Cadê meu dinheiro? Quando é que você vem?'", afirmou.
 
Vicente Malucelli gravou áudios de conversas que manteve com Traiano negociando o pagamento da propina. Em uma das conversas, o deputado pediu para entregar os cheques na casa onde mora.
 
Os áudios passaram por perícia do Ministério Público, que atestou que o conteúdo é autêntico e não sofreu edição ou adulteração.

Vicente Malucelli: Firme?
Ademar Traiano: [ininteligível]
Malucelli: Vai me dar o número da conta?
Traiano: [Ininteligível]… tem aí?
Malucelli: Não, não, to sacando amanhã.
(...)
Traiano: Mas assim ó, 10 horas, meu filho, quer marcar?
Malucelli: Eu tenho que ir no banco, sacar, ...dois cheque na mão
Traiano: Pra mim, cheque?
Malucelli: Eu saco...
Traiano: Cheque de quem? Da TV?
Malucelli: É
Traiano: Se não eu ia mandar os cheques
Malucelli: Quer cheque meu?
Traiano: Acho que seria melhor.
Malucelli: Eu trago
Traiano: Vou dar noutra pessoa, lá fora.
Malucelli: Dois de 25... daí trago amanhã de manhã, aqui, ou hoje ainda.
Traiano: Eu acho que eu preferia se fosse entregue hoje.
(...)
Traiano: Vou dizer, ó, pode dar o dinheiro
 
Durante as investigações, o Ministério Público identificou seis depósitos em espécie, de autoria não identificada, na conta do deputado estadual. Juntos, os depósitos somam R$ 57.540.
 
Segundo o MP-PR, as datas e o valores dos depósitos, somados à ausência de justificativa sobre a origem da quantia, são fortes indícios de vantagem indevida.
 
 
Pagamentos a Plauto Miró

Em relação aos pagamentos ao ex-deputado Plauto Miró, Vicente Malucelli afirmou, na delação, que o parlamentar teria ido à sede do Grupo J. Malucelli duas vezes, entre setembro e outubro de 2015, para receber duas parcelas de R$ 50 mil cada e que elas foram repassadas pessoalmente por Georgete Soares Bender, responsável pelas finanças do grupo J.Malucelli.
 
Segundo o Ministério Público, o primeiro pagamento teria ocorrido no dia 24 de setembro de 2015, pois há o registro de entrada de Plauto Miró na sede do Grupo J. Malucelli. O segundo pagamento teria se efetivado dias depois.
 
Georgete Soares Bender, que também fechou acordo de delação premiada com o MP, disse, em depoimento, que não conseguiram sacar tudo de uma vez e que Vicente pediu para ela entregar em duas oportunidades para o então deputado Plauto Miró.
 
Veja um trecho do depoimento de Georgete:
 
"Uma vez o Vicente disse que ele estava indo a Ponta Grossa/PR, ia passar ali na empresa e já ia pegar esse montante de R$ 50 mil. Ele chegou na recepção, se anunciou, daí eu fui buscá-lo, levei-o até a minha sala e entreguei o pacote com R$ 50 mil. Depois no outro período aconteceu a mesma coisa, também recebi ele na recepção, levei até a minha sala e entreguei R$ 50 mil pra ele novamente."

Os acordos de delação premiada de Vicente Malucelli e Georgete Bender foram homologados em 2020 pelo Tribunal de Justiça do Paraná.
 
Negociações

De acordo com Vicente Malucelli, o pedido de propina do presidente da Alep e do então primeiro-secretário aconteceu como contrapartida para renovar o contrato da assembleia com a TV Icaraí.
 
Na época, Malucelli era responsável pela TV, que venceu a licitação em 2012 para produção de conteúdo para a TV Assembleia.
 
Na delação, Vicente afirmou às autoridades que, numa reunião na Assembleia Legislativa, em agosto de 2015, com Ademar Traiano e Plauto Miró, o presidente da Assembleia pediu R$ 300 mil. Na época, Miró exercia a função primeiro secretário da Casa.
 
Segundo Vicente, foi negociado pagamento de R$ 200 mil - R$ 100 mil para cada.
 
"O Traiano falando que 'pô, nós precisávamos de uma verba para campanha, uma ajuda de campanha'. Eu inicialmente me fingi de desentendido, o Plauto não abriu a boca, e o Traiano escreveu num papel o valor de R$ 300 mil. Aí eu falei 'vou repassar pro acionista principal e eu venho com o retorno'".
 
Em outro trecho, o empresário afirma que levou a situação até Joel Malucelli, principal acionista do grupo J. Malucelli.
 
"Eu entendi naquele momento que se eu não colaborasse ou se não desse essa ajuda de campanha eu ia ter o contrato rescindido. Foi esse o nosso entendimento, mas o Joel ficou bastante consternado com o valor e depois de algumas diligências com ele, consignamos que íamos pagar R$ 200 mil, R$ 100 mil pra cada um. E aí eu voltei com a informação, uma semana depois ou três, quatro dias depois, e eles aceitaram".
 

O que dizem os citados xxxx

Em nota, Traiano afirma não haver nenhuma investigação em andamento sobre os documentos divulgados e que estão em segredo de Justiça.
 
"Esse documento sigiloso foi vazado ilegalmente, conforme já atestado pelo Ministério Público e pela própria Justiça. Apesar de uma decisão judicial ter liberado a imprensa de divulgar sobre os documentos já vazados, o sigilo dos atos processuais persiste, impondo-se que as devidas explicações sejam dadas apenas no momento oportuno", diz a nota.
 
A TV Icaraí informou que rescindiu o contrato de Vicente Malucelli em julho de 2021.
 
“A TV Icaraí Ltda. Tem a esclarecer que o senhor Vicente Baptista Malucelli Neto teve o seu contrato de prestação de serviços rescindido na data de 16/11/2021, em razão de condutas incompatíveis com as regras de governança da empresa e, portanto, não integra mais os quadros nem responde por este veículo de comunicação”.
 
A defesa de Vicente Malucelli classificou, nesta quinta-feira, a nota da TV Icaraí como inverdadeira. Afirmou que Vicente Malucelli é colaborador do Ministério Público nos escândalos de corrupção anunciados.
 
Disse também que Joel Malucelli é quem foi preso quando a operação aconteceu justamente por conduta incompatível com as regras de governança corporativa.
 
O grupo J. Malucelli e o empresário Joel Malucelli não se manifestaram.
 
O MP-PR disse que os procedimentos investigatórios que estão sob sua responsabilidade já receberam os encaminhamentos que eram necessários para as investigações e que, por ora, não pode se manifestar.
 


Fonte: G1/RPC PARANÁ